quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

- O QUE LEVO DA VIDA

   Levo da vida a doce sensação de dever cumprido. A alegria de olhar pra trás e perder de vista as amizades que conquistei.  Levo da vida um coração teimoso que amou com veemência sem esperar  retorno ou, se quer o súbito pensamento que eu fizera a mesma falta que essas pessoas me faziam. Basta-me crer, em algum momento, lugar ou ocasião fui indispensável, e esse momento se fez inesquecível.
  Levo da vida a fidelidade de pai, verdadeiros atributos de proteção, luta, doação. Lamento profundamente do meu fracasso, por diversas vezes não ter condições de oferecer além de minha mera presença.
  Levo da vida a terna gratidão por todos os problemas que encontrei ao longo de minha jornada; os problemas que na verdade, foi a solução de minha labuta e os autênticos responsáveis por meus sonhos se tornarem reais. 
  Levo da vida muitas lembranças... Lembranças das palavras de consolo que mamãe me dizia quando as coisas não iam bem. Dizia ela que o mundo é uma roda gigante em constante movimento cíclico, que nos leva para cima e para baixo. Dessa modesta comparação, retirei o aprendizado que não há razão para espezinhar meu próximo, se em algum momento dessas voltas serei eu quem estará sob seus pés.
  Acho que não é pecado levar da vida, também um pedacinho de saudade dos momentos perfeitos da infância,  dos assuntos inconfessáveis que se atenuaram lá no bojo da adolescência entre os corredores do colégio;  a disposição viril da mocidade que parecia não ter fim. Hoje, ficou uma imagem irrecuperável de rapaz, porém, meigas e ternas de quem fielmente cumpriu com louvor, paciência e firmeza cada instante doce e amargo. 
  Levo da vida o duro conformismo que as pessoas mais importantes  que tive irão embora de qualquer maneira queria ou não.
  Não custa dizer, que também deixo para a vida, a dignidade de missão cumprida; a consciência serena e limpa ou o súbito consolo, que da vida não se leva orgulho, dinheiro, fama, bens... Nada, nem a vaidade carnal do corpo que se consumirá numa réstia simples de modesto pó.

(In: E a vida acontece... pag. 61, UFSJ, 2012)

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